Justiça do Trabalho: Covid-19 – Doença Laboral

Recentemente, sentença proferida nos autos do processo nº 0010626-21.2020.5.03.0147, amplamente divulgada nos meios jurídicos e empresariais, causou verdadeiro alvoroço. Trata-se de decisão que condenou uma transportadora ao pagamento de indenização de duzentos mil reais, além de pensionamento, em favor da família de um empregado, motorista, que faleceu após contrair a Covid-19, por entender pelo reconhecimento de que a doença teria sido contraída em razão do ambiente de trabalho.

A decisão foi proferida em primeira instância e já foi alvo de interposição de recurso, ainda pendente de julgamento. Portanto, não é definitiva.

Nas razões de decidir que integram a sentença, foi analisada a atividade laboral nos dias que precederam o início dos sintomas da doença para, considerando o período de incubação, verificar onde e como estava o trabalhador no período em que pretensamente ocorreu a contaminação.

Paralelo a isso, foram examinadas, aos olhos do Juiz responsável pelo julgamento do caso, as condições de trabalho e as medidas afetivamente adotadas e comprovadas pela empresa para a prevenção à contaminação do coronavírus.

As ressalvas ao resultado do julgamento e às ponderações que o pautaram são diversas. A título de exemplo, possível citar:

  1. Impossibilidade ou no mínimo dificuldade de se afirmar, de forma inexorável, que a contaminação se deu em razão do trabalho (nexo de causalidade);
  2.  estamos diante de uma pandemia, pelo que a circulação do vírus ocorre em ambientes diversos, vários destes sem relação com o trabalho;
  3.  Razoável presumir a existência de situações em que o empregado possa não ter tido a necessária cautela protetiva, mesmo não estava trabalhando (e que, portanto ,não são de conhecimento e responsabilidade empresarial);
  4. Atribuição ao empregador de ônus de produção da chamada “prova diabólica”, no sentido de que o empregado não se contaminou no ambiente de trabalho;
  5. Inexistência de medidas que sejam absolutamente eficazes para evitar a contaminação, fato corroborado pela imensidão de casos da Covid-19 em todo mundo.

Mesmo com estas ressalvas, a sentença proferida se presta a chamar a atenção para o fato de que é imperiosa a adoção de medidas preventivas pelo empregador, seja por razões de saúde pública, seja para mitigar os riscos de se defrontar com situações concretas na mesa linha da acima relatada.

Nesta linha de raciocínio, a adoção e comprovação das medidas preventivas em muitos casos será o “fiel da balança” para afastar a responsabilidade das empresas. Quanto mais seja possível a demonstração empresarial de aplicação e fiscalização das medidas protetivas, mais se afasta o risco de condenações como a aqui tratada.

Exatamente por isso é que, ainda em maio de 2020, a equipe da MGF produziu uma CARTILHA, disponível em nosso site, a qual, dentre outros pontos, indica importantes medidas a serem adotadas pelas empresas, com o fim de mitigar a possibilidade de contágio e, em ocorrendo, de responsabilização do empregador.

Dentre as medidas sugeridas, reiteramos, por exemplo:

– Fornecimento de EPIs, EM QUANTIDADE RAZOÁVEL, tais como: máscaras, luvas, óculos de proteção, roupa de proteção, fornecimento de álcool 70%, dentre outros aplicáveis a cada caso;

– Reforço quanto a limpeza e desinfecção do ambiente relacionado ao trabalho;

– Adoção e incentivo de medidas em prol do distanciamento social, seja entre os colegas, bem como com clientes e fornecedores;

– Fixação de avisos e orientação quanto aos cuidados e regras de comportamento no ambiente de trabalho (inclusive com fotografias e vídeos);

– Treinamento dos colaboradores quando a efetiva adoção dessas medidas de prevenção de contágio;

– Criação e divulgação de protocolo de ação para casos de suspeita/confirmação de contágio;

– Ações específicas destinadas àqueles que façam parte do grupo de risco;

– Fornecimento, sempre que possível, de equipamentos, acessórios e ferramentas individuais, de modo a se evitar o compartilhamento;

Não mesmo importante, além da adoção de medidas, necessária a comprovação de sua aplicação, por exemplo através de vídeos, fotografias, declarações, atestados de comparecimento a treinamentos, recibos de entregas de EPI’s, etc., para que, em situação semelhante ao caso tratado no 0010626-21.2020.5.03.0147, seja possível a demonstração dessas ações.

Ressalta-se ainda que, a depender da particularidade da atividade econômica de cada empresa, medidas adicionais e específicas podem e devem ser analisadas.

Infelizmente, por tratarmos de um nexo “invisível” (contágio), o conjunto probatório a ser produzido é de suma importância para que se possa demonstrar que todo esforço possível foi observado e aplicado pelo empregador, com o objetivo de assegurar um ambiente de trabalho saudável e, ao mesmo tempo, evitar condenações judiciais em decorrência de danos causados ao empregado pelo Covid-19.

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